Beatriz de David Serafini Marchioro foi a escritora do Conto que ganhou 1° lugar na Categoria 01 do XVII Concurso Regional de Contos, Crônicas e Poesias Oscar Bertholdo No dia 30 de outubro de 2019, na Câmara de Vereadores, foram premiados os venced...

Beatriz de David Serafini Marchioro foi a escritora do Conto que ganhou 1° lugar na Categoria 01 do XVII Concurso Regional de Contos, Crônicas e Poesias Oscar Bertholdo

No dia 30 de outubro de 2019, na Câmara de Vereadores, foram premiados os vencedores do Concurso Regional de Contos, Crônicas e Poesias Oscar Bertholdo. O evento, já na sua 17ª edição, foi uma promoção da Prefeitura de Farroupilha, por meio da Secretaria de Educação e Biblioteca Pública Olavo Bilac. O objetivo da integração é incentivar a leitura e oportunizar a criatividade, valorizando o surgimento e o reconhecimento de novos talentos na arte da escrita.

Para a Secretária de Educação Elaine Giuliato, o concurso não incentiva apenas a escrita e a leitura; ele revela novos talentos literários. “Representa uma forma de pensar, de promover a cultura e a arte, expressando os sentimentos de uma maneira que ficará gravada para sempre, pois as palavras ficam. Parabenizo a todos os participantes que tiveram a coragem de criar textos e histórias que ficarão para sempre na nossa memória”, ressaltou.

Nesta edição, foram recebidos mais de 400 trabalhos que foram avaliados por um time de jornalistas que compôs a comissão.

Confira, agora, confira o conto de Beatriz de David Serafini Marchioro, que escolheu o pseudônimo “Beatriz” para participar e concorrer à Categoria 01 do XVII Concurso Regional de Contos, Crônicas e Poesias Oscar Bertholdo.

Alívio

Ana estava prestando atenção no padre em uma nova tentativa de acreditar nas suas palavras, mas para ela aquelas frases continuavam vazias e sem sentido.
Chegando em casa, seu namorado olhou-a de um jeito diferente, e uma onda de medo percorreu seu corpo. Ela já conhecia aquele olhar. Com uma voz calma, ele disse: “Por que você demorou tanto pra chegar?”. Ela ficou paralisada por um instante e, enquanto seu corpo temia, respondeu: “Eu sempre demoro um pouco pra vir da missa pra casa, eu venho a pé”. O cheiro de álcool pairava no ar, quando de súbito ele pegou-a pelos braços e já com outro tom de voz falou: “Você estava na igreja? Porque se não estava eu vou ter que te dizer novamente que isso te faz mal. Ficar longe de Deus te deixa bem estranha e, além do mais, você sabe que eu te amo muito, mas se você estivesse com outro cara eu não sei o que eu seria capaz de fazer…”. A garrafa dele foi arremessada no chão e seguida por um grito agudo. Os dois já sabiam o que viria a seguir.
No dia seguinte, ela acordou dolorida, e, como sempre, não queria sair da cama, lamentava ter acordado. Depois de tomar banho, olhou-se no espelho e teve vontade de quebrá-lo, mas percebeu que isso não mudaria nada, então, quando ficou pronta, foi ao ponto de ônibus, e, quando este chegou, Ana subiu as escadas depressa, pois havia mais pessoas atrás dela. Chegando no último degrau, ela tropeçou e caiu no chão, o que fez com que uma parte de sua blusa levantasse, deixando uma parte de suas costas à mostra. O homem atrás dela tentou ajudá-la, mas ela levantou, pagou o cobrador e foi correndo para um lugar no fundo do ônibus.
Ela observava a paisagem através da janela e suava, quando uma mão tocou seu ombro. Ela virou-se abruptamente. Vendo sua reação, o homem ao seu lado tentou acalmá-la dizendo que ele a tinha visto antes e só queria ajudá-la. Com medo das consequências em seu relacionamento por ter essa conversa, ela recusou a ajuda e virou seu rosto. Entretanto, ele insistiu, permanecendo ao seu lado, e após um tempo disse: “Olha, eu sei que você deve ter medo de me contar o que eram aqueles hematomas em suas costas, mas se algum dia você criar coragem ou quiser falar qualquer outra coisa, ligue para este número aqui”, dando-lhe um papel, o qual ela olhou por um tempo e guardou no bolso. O homem então saiu do banco, deixando Ana com uma sensação de esperança e culpa.
Na faculdade, era o dia de apresentarem um trabalho e, após todos os alunos da turma o fazerem, o professor a parabenizou dizendo que seu trabalho estava excelente e que ele não esperaria menos de uma aluna tão dedicada. Nos outros períodos, os professores explicaram seus respectivos conteúdos. Ela, às vezes, olhava para seus colegas, desejando poder ter uma relação com eles.
Voltou para casa exausta e, quando voltou, viu seu namorado no sofá. Ele, por sua vez, ao ouvir o barulho da porta fechar, começou a falar: “Eu já te disse que essa sua faculdade só atrapalha a gente. Eu pago todas as contas desta casa e você gasta não sei quanto com essas tais aulas. Além disso, você ainda chegou a essa hora pra fazer o almoço, enquanto eu, depois de um dia cansativo no trabalho, fico aqui te esperando exausto e com fome. Você acha isso justo comigo?”. De cabeça baixa, ela resmungou um “não” e foi para a cozinha.
Alguns dias depois, já não indo mais à faculdade, sozinha ela perambulava pela casa quando viu um espelho. Uma lágrima foi derramada, e ela procurou uma calça, mais especificamente o bolso dela, onde achou um papel. Ela ligou… Mas, após a atenderem, desistiu de responder e desligou.
Depois da janta, enquanto ela lavava a louça, seu namorado, que estava no quarto, chamou-a para conversar. Quando ela chegou ao quarto, ele mostrou o celular dela e perguntou de um certo cara para quem ela havia ligado. Sem resposta, ele disse: “Eu liguei para ele e disse que era para ele apagar esse número, porque você já tinha dono. Você não gosta mais de mim?”. Ela rapidamente respondeu que sim, que gostava. Então ele trouxe-a para perto e começou a falar em seu ouvido, “vem aqui”. Ela respondeu: “Eu não quero”, o que fez ele exclamar: “Viu?! Eu disse que você não gostava de mim!”, e puxou-a mais para perto: “Hoje você vai gostar”. Naquela noite, ouviram-se gritos de socorro.
Com o passar dos dias, ela se sentia cada vez mais sozinha, já que não saía mais nem para a faculdade, apenas para a igreja, a qual ela só ia para não desapontar seu “companheiro”. Às vezes, ela até perdia a noção das horas. Já que tinha bastante tempo livre, começou a pensar, em tudo, via sua vida de outra forma e se sentia culpada pelo ponto em que havia chegado.            Um dia, depois de ferver a água do chá e colocá-la junto à camomila em uma xícara, ela sentou na única cadeira que havia naquela pequena varanda. O céu estava nublado e uma brisa soprava sua nuca descoberta. Seu palpite é que a tarde chegava ao fim. Não era a primeira vez que essa cena se passava, porém as madrugadas a acolhiam melhor.
Esse vazio se tornava presente, e pensamentos conflitantes surgiam subitamente, então, por trás de um rosto sereno que estava observando o céu, havia uma tempestade que não conseguiu se conter e acabou escapando, fazendo com que uma lágrima escorresse por seu rosto seguida por muitas outras. Em poucos segundos, não era mais possível distingui-las, pois formavam um rio, uma correnteza… O muro havia sido quebrado, e ela não sabia se conseguiria voltar atrás.
Os pensamentos continuavam seguindo o fluxo do rio, e a vista do oitavo andar era hipnotizante. Ela não aguentava mais nada, não aguentava mais tudo isso. Ela sentia a brisa em todo o seu corpo quando… o telefone tocou. Ela atendeu, e uma voz conhecida falou: “No dia do ônibus eu já suspeitava, mas ainda não tinha certeza. Quando ele atendeu, eu percebi o que estava acontecendo, agora sei que você precisa de ajuda. Eu sei que provavelmente você não vai aceitar minha ajuda, mas pelo menos me diga onde você mora”. Ela, sem saber muito o que dizer, respondeu: “Eu moro em frente à praça da cidade, mas não perca seu tempo vindo até aqui. Você não pode me ajudar mais”.
Ana subiu sobre a grade da escada e o vento tocou seu corpo como nunca antes. Ela olhou para o asfalto úmido e a liberdade transbordou seu corpo. Ela finalmente faria o que queria.
Algum tempo depois, a polícia viu a cena: um homem deitado sobre um corpo no asfalto em frente à praça chorando e dizendo que chegou tarde demais.

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Data de publicação: 17/03/2020