Que a vida muda a partir do momento que uma pessoa contrai o vírus HIV todos sabem. Na maioria das vezes, a jornada se torna, no mínimo, mais trabalhosa e delicada.

           Que a vida muda a partir do momento que uma pessoa contrai o vírus HIV todos sabem. Na maioria das vezes, a jornada se torna, no mínimo, mais trabalhosa e delicada. Lidar com a descoberta, com a confirmação do exame médico, com a aceitação da nova condição e especialmente com o preconceito não é tarefa fácil. “Embora não seja regra, é possível que o paciente passe por um processo psicológico semelhante ao luto, que pode levá-lo por exemplo, a negação do seu diagnóstico, passando por outros momentos de raiva, barganha, depressão e aceitação”, relata a Gerente de Enfermagem da Associação Farroupilhense Pro-Saúde, Daniela Zanco.  

          Para acolher os portadores do HIV, de forma multidisciplinar e proporcionar maior qualidade de vida a eles e seus familiares, foi implantado em 2016, em Farroupilha, o Serviço de Assistência Especializada (SAE). “Percebo que aqueles que têm diagnóstico mais recente, se questionam muito sobre como será a vida ou acham que logo vão morrer. Tem pessoas, inclusive, que arrumam diversos empecilhos para não procurar o tratamento, por negarem a doença. Por isso é fundamental oferecer esse atendimento especializado”, afirma a enfermeira Coordenadora do Serviço, Débora Raquel Ceretta.

          O local oferece desde os testes rápidos para o diagnóstico, passando pelos atendimentos clínico, médico, de enfermagem, encaminhamentos psicológico, nutricional e social, além de disponibilizar os remédios para o tratamento, através da Farmácia Popular. Antes da instalação, os pacientes eram atendidos em Caxias do Sul. Por isso, os que já iam para a cidade vizinha, tem o direito adquirido de continuar lá, porém, podem optar a qualquer momento pelo atendimento em Farroupilha. “Com o serviço aqui eles são atendidos de forma mais ágil, não perdem o dia todo, além de economizarem com passagens ou combustível”, explica Débora.

          Todo o atendimento é realizado de forma extremamente reservada, como enfatiza a enfermeira. “O que eu sempre digo é que as pessoas não precisam ficar com receio de procurar o atendimento, por medo de serem vistas entrando aqui. Todas as informações são sigilosas, e além do mais, o SAE atende outras patologias, como hepatite, tuberculose, hanseníase e está do lado de uma UBS, que é utilizada por todos.”

          Tranquilizar as pessoas nesse sentido é essencial, já que o preconceito é fruto do desconhecimento.  “Eu acompanhei portadores do vírus durante mais de trinta anos como médico. Todos nós sabemos que essa doença já nasceu com a discriminação, segregando e marginalizando. Se hoje ela ainda é rodeada de mitos e dúvidas, imagina como era há décadas. Então, ter um serviço como esse no nosso município é extremamente importante para oferecer tratamento multidisciplinar e dar segurança a total a esses pacientes”, avalia o Prefeito Claiton Gonçalves.

          O recado vai também para aqueles que convivem com portadores do vírus. “É necessário salientar, já que as pessoas ainda tem muitas dúvidas, medo e assim surge a discriminação, que o paciente com HIV não vai transmitir o vírus com um abraço, um beijo, se tomar água no mesmo copo ou se dividir a cuia de chimarrão”, explica o médico do SAE,  Norberto Pastori Filho.

          Hoje em Farroupilha são atendidos 135 moradores infectados e em Caxias outros 174.  Conforme a Organização Mundial da Saúde, estima-se que para cada pessoa contaminada existem outras dez que possuem o vírus e não sabem. “Obviamente que o diagnóstico é sempre pra menos, por que tem muita gente com a doença e não sabe. Esse número aqui no município chega a três mil, o que é um índice alto. Aliás, o Rio Grande do Sul tem uma das prevalências do HIV mais altas do Brasil. Acredita-se que alguns fatores possam influenciar nisso, como a questão cultural de não fazer uso do preservativo, de não procurar atendimento médico, regiões com portos, turismo, etc.”, avalia Norberto.

          Para mudar esse cenário, Farroupilha disponibiliza no SAE e em todas as Unidades Básicas de Saúde, o teste rápido. Qualquer pessoa pode realizá-lo, basta agendar um horário e apresentar Cartão SUS e documento de identificação. O resultado sai em até uma hora. “Todos que têm vida sexual ativa podem e devem fazer. Nossa recomendação é que aguardem entre 30 e 60 dias após a suspeita de exposição ao vírus. Nesse intervalo, ocorre a produção de anticorpos anti-HIV no sangue, que confirma a infecção”, explica o médico.

Profilaxia Pós Exposição

          Em caso de relação desprotegida, existe a Profilaxia Pós Exposição. A PEP evita a sobrevivência e a multiplicação do HIV no organismo de uma pessoa. Ela é indicada para quem pode ter tido contato com o vírus em algumas situações, tais como:

– Violência sexual;

– Relação sexual desprotegida (sem o uso de camisinha ou com rompimento da camisinha);

– Acidente ocupacional (com instrumentos perfurocortantes ou contato direto com material biológico).

Para funcionar, a PEP deve ser iniciada logo após a exposição de risco, em até 72 horas. “A pessoa vai usar medicação por 28 dias e ter acompanhamento por 90 dias. Se caso tiver tudo certo, ela é liberada. Todas as UBS tem esse atendimento durante o horário de expediente. Em noites, finais de semana e feriados, as pessoas devem procurar o Pronto Atendimento do Hospital São Carlos”, orienta a enfermeira Débora. A PEP não serve como substituta à camisinha.

Depois do Diagnóstico

         Quando a infecção é comprovada, o paciente recebe a orientação necessária e é encaminhado para o SAE, onde terá o acompanhamento adequado. Débora reforça que é importante aceitar o diagnóstico, iniciar o tratamento e especialmente, dar continuidade a ele. “Se não tratar, o vírus acaba atacando as células de defesa do organismo e qualquer gripe ou uma diarreia pode se tornar um grande problema”, reforça.

          “Hoje consideramos a Aids uma doença crônica, que não tem cura, mas que tem controle. Assim como a hipertensão, que tem que tomar remédios todos os dias, se não a pressão volta a subir, o HIV é assim também. Se parar o tratamento, ele aflora. Hoje em dia, os tratamentos melhoraram muito e se pode ver pessoas envelhecendo com a doença”, salienta Dr. Norberto.

          O tratamento normalmente começa com a primeira linha de medicação, que tem menos efeitos colaterais. “Se ela não toma os remédios, relaxa, esquece, vai começar a criar resistência, os remédios terão que ser outros, com mais efeitos colaterais. Por isso, o quanto antes a pessoa souber o resultado e iniciar o acompanhamento, melhor para sua saúde”, diz Débora. A qualidade de vida também depende do comportamento da pessoa em relação a alimentação saudável e a prática de exercícios.

         Conforme o médico Norberto, é comum ter casos de pacientes que começam e param o tratamento, ou que só procuram atendimento quando adoecem, o que aumenta a cadeia de transmissão da endemia. “O mais importante é procurar o diagnóstico o mais rápido possível. Depois vamos receitar o melhor tratamento para que a pessoa tenha uma vida mais longa e um controle melhor da doença. Quando ela só procura ajuda estando doente, ou seja, com AIDS, significa que ficou de oito a dez anos transmitindo a doença para outras pessoas”.

Prevenção é sempre o melhor remédio

          O Ministério da Saúde aponta que mais de 95% da população sabe que a camisinha é o modo mais eficiente para não contrair o vírus da AIDS. Porém, uma pesquisa de 2016 da Gentis Panel, empresa especializada em pesquisa de mercado, revelou que 52% dos brasileiros nunca ou raramente usam preservativos, 10% utilizam às vezes e só 37% se protegem sempre ou frequentemente. “Muitas pessoas iniciam uma relação usando o preservativo, usa nos primeiros meses e quando estão namorando não usam mais. Depois essa relação termina e no próximo namoro, a situação se repete. Esse também é um comportamento de risco”, opina Norberto.

         Farroupilha vem trabalhando durante todo o ano, em diversas frentes para orientar e sensibilizar a comunidade sobre o assunto. O SAE e o Departamento de Vigilância Epidemiológica promovem campanhas em pontos centrais da cidade em datas específicas. No Dia Nacional de Combate a Sífilis e no Dia Mundial de Luta contra a AIDS, em 2016 e 2017 foram atingidas 14 mil pessoas, realizados 478 testes rápidos, distribuídos 11 mil folders, quase 9 mil preservativos masculinos, 1,5 mil preservativos femininos e 4 mil géis lubrificantes.

Outra estratégia é orientar os jovens diretamente nas escolas. Desde 2016, estudantes de instituições municipais e estaduais, do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, têm a oportunidade de assistir à peça de teatro “Comigo Nunca”, do grupo Tem Gente Teatrando, de Caxias do Sul. A história de quatro adolescentes na descoberta de sua vida amorosa e sexual, aborda a prevenção das ISTs, o preconceito com portadores do HIV e a importância de saber conviver com as diferenças. No ano passado, 2,4 mil alunos assistiram a 12 peças teatrais e participaram de 98 oficinas sobre o assunto.

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Texto: Renata Parisotto

Fotos: Bancos de Imagens

Ilustrações: Jonas Viega

Edição: Assessoria de Imprensa e Comunicação Social

imprensa@farroupilha.rs.gov.br

Data de publicação: 25/01/2018